21 de janeiro de 2020

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As pedras choram sozinhas

Desculpa se agora eu desagrado e desfaço os meus nós que eram antes tão firmes. Desculpe se a minha voz alta agora está rouca porque cansou de gritar. Desculpe se o segredo não é mais segredo porque eu contei. Desculpe se a mágoa não é pouca e se até mesmo a música parou e o violão ficou esquecido, pendurado na parede. 
Agora eu vejo esse retrato torto e percebo o quão era grande o meu encanto por aquilo que só eu senti. Relembro todos aqueles dias em que a alegria imperou no meu tom e no meu riso afrouxado e sem pretensão, quando pensava que todos os "nãos" poderiam ser alterados e o mundo inteiro por fim ficaria mais feliz. Mal sabia eu que na maioria das vezes não é bem assim.
Sei que nunca é pra sempre e que, como dizia Raul, a chuva voltando para a terra, trás coisas do ar e as pedras choram sozinhas permanecendo no momento lugar. Sei que um dia aprenderei a não ter medo da chuva, medo da vida e medo daquilo que desconheço. Pode ser que dê tudo certo e que a água volte a correr rio abaixo, que as árvores floresçam e que o guarda chuva permaneça fechado. Até isso acontecer, ela vai seguir, sempre em frente, porque embora tenha todo o tempo do mundo, até o "pra sempre", sempre acaba. 


Quando penso em alguém, só penso em você. Aí, então, estamos bem. 
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20 de janeiro de 2020

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Pertencer-se

Ela pensou ser capaz de alcançar aquilo que estava além da margem do horizonte que pela janela conseguia enxergar. Ela pensou que nunca se sentiria entre amarras e sombras, dentro de uma caverna. Ela pensou que poderia fazer piada, mas no início ela não acreditou que a piada poderia ser ela e que ao sumir o mundo enfim poderia descansar. 
Ela acreditava ser capaz de ganhar qualquer jogo que lhe mostrassem, ganhando todas as peças do tabuleiro. Pensou que poderia transformar qualquer coisa em arte e defender-se até mesmo do que for raivoso e indomável, semelhante ao que Alexandre fez com seu Bucéfalo ao dominá-lo. Ela pensou que teria os mesmos cachos dourados e que seria uma grande guerreira. Ela pensou que estava pronta pra ser alguém que está sempre pronto a lutar.
A menina pensou que precisava ter sempre a melhor armadura e a melhor espada. Ela pensou que deveria tentar sempre ser maior que o mundo e que somente conquistando tudo poderia se encontrar. 
Talvez seja necessário recuperar a consciência e reunir todas as peças perdidas em uma gaveta. Talvez seja necessário limpar as teias e o pó daquilo que ainda restou de si mesma dentro dela, pondo-se a sua própria disposição. É necessário sacudir-se ao vento e correr solta como as crianças correm no gramado. É necessário dar-se um tempo e uma segunda chance de se reconquistar. 
Menina, corra! Corra como se não houvesse amanhã e como se não houvesse nenhuma voz que pudesse lhe comandar. Corra, sem medo de arriscar, sem medo de tentar entender a si mesma, sem medo de mudar. Não haverá prêmio para quem cruzar a linha de chegada depois de um trajeto sem percalços e chegar em primeiro lugar. Não há segunda chance, nenhum olhar de aprovação vai substituir a alegria de pertencer-se. 
Os sinos ainda vão tocar. Eles vão anunciar que o fim chegou e, quando isso acontecer, não poderemos voltar atrás. Um dia tudo se transformará em poeira. Um dia as estrelas vão parar de brilhar nos olhos dela e o jogo vai acabar. 

Quem sabe, um dia ela aprende a cantar, a gritar sem sentir dor, a correr sem olhar para trás e, principalmente, a voar sem cair.


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